13 de abril de 2017

O Crucifixo Contra o Ovo da Páscoa




Para a maioria das pessoas, o feriadão da páscoa vai passar batido, apenas como mais uma oportunidade de descansar. As tradições e o significado são ignorados ou aceitos sem discussão.

A páscoa moderna tem uma enorme contradição: o choque grotesco entre uma celebração secular da felicidade e um culto religioso ao sofrimento.


A parte agradável da páscoa é o seu lado secular, o lado relacionado ao coelho e aos ovos. Só que essas tradições não têm nada a ver como cristianismo. Na verdade, são anteriores ao cristianismo. A própria palavra easter (páscoa em inglês) vem do nome anglo-saxão de uma deusa que personificava a primavera. A palavra páscoa vem do hebraico pesach, também relacionada a uma celebração do retorno da primavera. Estas festividades eram realizadas por pastores nômades desde antes de Moisés.


Foi dessas celebrações pré-cristãs que vieram o coelho e o ovo da páscoa. O coelho simboliza a fertilidade com sua capacidade de reprodução rápida e numerosa; o ovo é um símbolo natural de nova vida; as cores e marcas brilhantes com que os ovos eram adornados representavam a luminosidade da primavera se contrapondo ao inverno de noites longas e dias cinzentos. A páscoa original era um rito pagão, ligado à natureza, comemorando o retorno do calor e da luz solar, das folhas verdes após um longo inverno. Era a celebração da alegria de viver, de ter sobrevivido, do recomeço da vida, da possibilidade de plantar e colher novamente.


Ao cristianismo não interessava manter uma festa pagã, relacionada a deuses e deusas antigos, bem como a uma pecaminosa celebração da vida e seus prazeres. Contudo era um costume muito arraigado, milenar. Então, ao invés de proibir a festa, os cristãos inteligentemente se apropriaram dela (assim como fizeram com o natal): mantiveram sua data, mas alteraram seu significado, enxertando nela a história da crucificação e da ressurreição de Jesus.


O problema é que cristãos e pagãos celebram coisas completamente opostas.


A essência da “páscoa” cristã não é a alegria de viver, mas a adoração ao sofrimento e ao sacrifício. De acordo com o cristianismo, somos todos pecadores e Jesus escolheu sofrer a morte lenta e agonizante de uma crucificação para redimir nossos pecados. Os santos cristãos são pessoas que também renunciaram a todos os seus interesses ou valores pessoais. Devíamos todos seguir seus exemplos.


Funciona assim:
  • Se você valoriza o que tem, o que conseguiu com seu trabalho honesto, deve se lembrar que Jesus renunciou aos bens materiais e escolheu viver na pobreza.
  • Se você tem sonhos e ambições, como uma carreira, abrir um negócio, pode parar! Esqueça seus interesses egoístas, pois veja: Jesus largou tudo que era seu e se dedicou à missão estabelecida por deus, mesmo que, num certo ponto, isso significasse morrer pela missão.
  • Se você gosta de sexo ou outros prazeres do corpo, lembre-se que Jesus rejeitava, dizem, essas tentações pecaminosas.
  • Se você está em dúvida, lembre-se que Jesus renunciou às suas dúvidas e colocou sua vida nas mãos de deus.


Para o cristianismo, são pecados todos os valores que fazem com que sua vida valha a pena ser vivida: suas posses, seu trabalho, seu corpo, sua mente independente.


Este é o verdadeiro símbolo da mensagem cristã da páscoa: não ovos e coelhos representando a alegria e a vida, mas o corpo de um homem pregado a uma cruz, vítima de um instrumento de execução precedida de longa tortura, absurdamente dolorosa, bárbara e desumana. Entretanto, aquele homem teria poder para livrar-se, mas se submeteu espontaneamente. É o símbolo supremo do sacrifício.


Seria este um símbolo de um ideal a ser seguido? O cristianismo traz consigo uma filosofia moral que nos diz para encontrar valor na destruição das coisas que valorizamos. Entretanto, só os “santos” são capazes de fazer isso. Nós, pessoas comuns, nos agarramos ao que nos mantém vivos, ao que nos dá motivos para viver, e por isso somos considerados pecadores! Prazer, sucesso, ambição e liberdade? Nada disso! Todas essas coisas estão associadas ao sentimento de culpa pelo “crime” de pensarmos em nós mesmos. Esta é a essência da moral cristã.


Que tal uma outra moral baseada na vida, na liberdade individual e na felicidade, na realização de valores, carreiras produtivas, relacionamentos românticos honestos, mentes independentes?
Vista por este prisma, a moral cristã baseada no dever e no sacrifício é simplesmente… indecente.

A páscoa está aí novamente e você pode escolher: vai olhar para o crucifixo e se recolher em pensamentos mórbidos sobre o quanto você é pecador porque falha em se sacrificar pelo interesse dos outros ou vai comemorar (e bebemorar) a vida, a realização e a felicidade representadas pelo ovo e pelo coelho?


Este texto é uma adaptação/versão do texto original de Robert W. Tracinski.

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